Tuesday, June 19, 2007

Estaria correto a remoção das nossas águias e outras espécies de aves de rapína da LIsta de espécies ameaçadas no MMA?

Por muitas décadas as espécies do genero Spizaetus, Harpya, Morphnus e outras espécies de aves de rapina estiveram presentes na lista de espécies ameaçadas do Ministerio do Meio Ambiente (MMA). Helmut Sick foi um dos que sempre lutou pela permanência destas espécies na lista de espécies ameaçadas brasileira. As razões pelas quais Sick se preocupava deviam estar associadas à sua experiência em nossas matas. Sick conheceu o Espirito Santo quando era coberto de florestas. Lembro dele triste ao contar da destruição das matas que ele percorrera naquele estado. Recordo também do saudoso e igualmente emerito Ornitólogo Oliverio Pinto demonstrando o mesmo pesar ao lembrar das florestas que percorreu em Alagoas, que já nos anos 70 rumavam a galope para o atual estado de fragmentação.

Recordo de cenas que eu mesmo vivi em Santa catarina e Rio Grande do Sul nos anos 70 quando cruzava de ônibus pela 101 e ainda via florestas paludosas nas baixadas, que hoje foram em sua quase totalidade transformadas em pastagens e agricultura.

Hoje em dias, os jornais e portais de noticia da internet noticiam conglomerados de investidores gananciosamente pleiteando o licenciamento para reflorestamentos com eucaplito que ocuparão centenas de milhares de hectares na campanha gaúcha. Estes mesmos portais relatam um impeto nunca antes observados pela agroindustria invadindo a floresta amazonica com a soja com o aval do governo federal. Esse mesmo governo federal vem realizando o maior lobby de todos os tempos para diminuir o já baixo rigor no processo do licenciamento ambiental para estes empreendimentos.

O Governo federal ainda luta pelo licenciamento de mais barragens hidrelétricas que alagam os poucos remanescentes florestais ao longo de nossos rios já castigados pela agroindustria.

Isso tudo apenas para uma introdução ao óbvio - nossos habitats naturais diminuiram alarmantemente ao longo destas décadas. Então vem a pergunta que não se cala em minha consciência: como então retiraram espécies sensiveis à estas atividades antropicas como as aves de rapina?

A resposta na ponta da língua pelos responsáveis pela lista é que eles seguiram a metodologia do Livro Vermelho da UICN - autoridade máxima nestas questões. Ao que volto a perguntar: como estas autoridades retiraram espécies de aves de rapina em paises que enfrentam problemas de destruição de habitat como os do sudeste asiático, Africa, Indonésia, Argentina e outros tantos países?

Por outro lado, o Christian Science Monitor vem com uma noticia bem interessante:Espécies comuns enfrentam declinio dramático. Isto é referente a espécies norte americanas após um estudo da Audubon Society. Neste estudo muitas espécies comuns de aves estão enfrentando um declinio dramático. Segundo o estudo, 20 espécies comuns estudadas apresentaram um declinio de 54 % dsde 1967. Algumas chegaram a declinar cerca de 80%! E são espécies comuns. Os investigadores apontaram causas como a agroindustria, o aquecimento global entre tantas.

Devemos considerar que a Audubon Society vem realizando contagens de aves das mais comuns as mais raras há muitas décadas e contam com um invejável banco de dados para estudos comparativos. Pergunto então como os pesquisadores da UICN e os nossos pesquisadores brasileiros chegaram a conclusão de que nossas águias não enfrentam mais problemas que justifiquem sua inclusão na lista de espécies ameaçadas? Teriam nossos pesquisadores algum parâmetro similar ao que utilizou a Audubon Society, ou mesmo as similares europeias?

Pelo que eu sei, não temos isso no Brasil, ou em qualquer pais do terceiro mundo. Um exemplo próximo foi o Livro vermelho do Rio Grande do Sul que listou algumas espécies como a Harpia/Gavião real (Harpya hapyja), o Gavião de Penacho (Spizaetus ornatus) e o Uiraçu-falso (Morphnus guianensis) como extintos naquele estado brasileiro. Basearam sua conclusão em pouco trabalho de campo e na publicação do excelente observador de aves William Belton. Belton foi um exímio observador de aves que percorreu o Rio Grande do Sul registrando as espécies de aves do estado. Belton usava redes e observava as aves nas proximidades e não percorria grandes distãncias buscando as aves de rapina em particular. Desta forma ele não registrava espécies do genero Spizaetus com frequência. Portanto, seus dados referentes a espécies de aves de rapina de maior porte, ou mesmo as do gênero Accipiter não são apropriadas para extrair conclusões sobre algum declinio, ou mesmo sobre padrões de ocorrência. No entando, os autores do Livro Vermelho do RGS apontaram como extintas algumas destas espécies de águias tendo como base o livro do Belton sobre as aves do RGS. Mais recentemente alguns pesquisadores gaúchos começaram a registrar o Spizaetus ornatus em algumas localidades e deu-se inicio a uma suave mudança de opinião sobre a presença ou não destas espécies no RGS.

A exclusão de espécies de aves de rapina diurnas e noturnas na lista de espécies ameaçadas brasileiras pode ser considerado um passo para atrás no processo da conservação. Por que? Considerando essa corrida dos investidores para o abrandamento no licenciamento ambiental, podemos dizer que a falta das águias e outras aves de rapina na lista de espécies ameaçadas somente facilita o processo.

Se espécies de aves comuns vem apresentando declínio na America do Norte, imaginem o que está acontecendo no Cerrado, na Caatinga, na Floresta Atlântica e na Amazônia? Imaginem nossa águias e corujas o que devem estar passando? Nossa lista precisa de uma revisão urgente.

A matéria noticiada pelo Christian Science Monitor sobre o alarmante declinio de espécies comuns de aves, creio que isso deva servir de um sinal de alerta para nós como ornitólogos e como cidadões e buscar corrigir esta falha terrível em nossa lista de espécies ameaçadas do MMA.

1 comment:

Márcio Heder said...

Com certeza aves de rapina devem constar da lista de ameaçadas...

A questão porém é quais realmente seriam as espécies que deveriam estar presentes, temos mais de sessenta espécies de rapinantes diurnos, dos quais a grande maioria não possui material científico significativo coletado, quase sempre nos baseando nos materiais dos pesquisadores pioneiros.

Desta forma não conhecemos ao certo suas populações históricas e distribuições corretas, e pouco trabalho metódico está sendo realizado para levantamento da situação atual e o devido acompanhamento periódico, fatores base para determinar se está havendo um declinio ou não em suas populações.

Espécies raras, como o Accipter poliogaster e Falco deiroleucus não constam da lista, mas é provável por sua população normalmente pequena e suas necessidades com relação ao habitat que estas sim sejam espécies que mereceriam constar na lista nacional.

Para a lista nacional a região amazônica é um fator que desequilibra, "teoricamente" as populações de certos rapinantes nesta região compensariam sua extinção ou ameaça em outras regiões, como é o caso da Harpya harpyja, os Spizaetus sp. e as duas espécies raras citadas acima, desta forma "nacionalmente" não estão em extinção :( .

Por outro lado também concordo que as listas regionais apresentam distorções que merecem revisões, espécies tidas como extintas em determinadas regiões estão aparecendo novamente, como o Parabuteo unicinctus na lista de Estadual de São Paulo (a alguns anos atrás um pequeno grupo foi avistado até na área urbana da capital) e mesmo famílias de Harpyhalietus coronatus tem sido avistadas em fragmentos de cerrado no interior do estado.

Acredito que é primordial o incentivo à pesquisa relativas ao levantamento das populações de rapinantes, não somente das espécies emblemáticas, como as outras mais raras e desconhecidas. Assim saberemos ao certo quais aves devem ser incluídas ou retiradas das listas.